sábado, 27 de junho de 2015

Terapia Breve - uma alternativa

Para fechar os meus posts introdutórios, vou falar um pouquinho sobre terapia breve, uma modalidade que pode ser interessante para ser conciliada com um dos maiores problemas da atualidade: a tal da falta de tempo (e, muitas vezes, de dinheiro), que, embora bem relativa, é uma justificativa bem frequente.

Há terapias breves em várias abordagens teóricas. O princípio é o mesmo: eleger um comportamento-alvo, sintoma, ou qualquer outro nome que designe algo que causa sofrimento para uma pessoa e traçar um plano terapêutico focado neste problema. Nesta modalidade terapêutica, há um número predeterminado de encontros e tarefas específicas para serem cumpridas. Normalmente, são utilizados até 20 encontros (o número mínimo varia entre quatro e seis, dependendo da abordagem e do problema a ser trabalhado. É bem usual se ver propostas de 10, 12 e 15 encontros, cada um com cerca de uma hora de duração), o que significaria um tratamento de até cinco meses, sendo um encontro por semana. São boas alternativas para pessoas que estejam altamente motivadas a lidar com a situação-problema e dispostas a promover mudanças efetivas em suas vidas. Ademais, boa parte dos transtornos mentais considerados leves ou bastante específicos podem responder positivamente a esta modalidade terapêutica. Porém, transtornos mentais de origem orgânica, autismo, alguns transtornos de personalidade, transtorno bipolar, deficiência mental e transtornos mentais severos não possuem esta indicação.

Para muitas pessoas, pensar em um período com começo, meio e fim para atender a uma questão psicológica ajuda a diminuir a resistência, pois um dos fatores que mantém as pessoas afastadas do consultório é a falta de perspectiva quanto ao fim do tratamento. E, se pararmos para pensar, muitos tratamentos na área de saúde levam um tempo considerável para serem concluídos. Por exemplo, quanto tempo leva para alinhar a arcada dentária com aparelhos ortodônticos? Quase nunca menos de um ano. Recuperar um osso de uma fratura simples? seis semanas, mais algum tempo de fisioterapia, isso se não houver lesão em articulações. Desta forma, pensar em alguns poucos meses para tratar um problema que causa sofrimento parece bastante razoável.

Para realizar um tratamento dentro desta linha, o interessado deve procurar especificamente um profissional que trabalhe com ela, lembrando que há profissionais em psicologia que são contra esta abordagem, por diversos motivos. No entanto, é uma prática regulamentada e fundamentada, que pode ser ministrada por quem conheça seu método. Por isso, se é este seu objetivo para com o tratamento, pergunte ao terapeuta se ele é capacitado para tal. Em segundo lugar, quando for à consulta de avaliação, seja sincero com o terapeuta e consigo mesmo. A avaliação é de sua importância para delinear o tratamento, e fatalmente este falhará se a avaliação não for condizente com o problema, portanto, tente ao máximo não distorcer, omitir ou minimizar questões. Outro ponto importante é ter em mente que o número de sessões é predefinido, mas o terapeuta pode, caso julgue necessário, estender o período de tratamento ou até mesmo propor o sistema tradicional, caso detecte no curso da terapia mais questões do que se supunha a princípio. Cabe ao paciente aceitar ou não, mas tendo em mente que o profissional realizou uma análise técnica sobre o problema para concluir que o tempo predefinido não seria suficiente para o seu caso, portanto, reflita. 

Dúvidas? Sinta-se à vontade para perguntar. Este foi um artigo introdutório, para apresentar esta modalidade terapêutica.

segunda-feira, 8 de junho de 2015

Linhas Teóricas- Psicanálise

Seguindo a proposta do post anterior, hoje vou falar sobre a psicanálise. Já havia mencionado as particularidades do psicanalista aqui, e agora vou dar uma pincelada básica em como funciona. Novamente digo, este é um texto de abordagem superficial, para conhecimento do público. Creio que o primeiro fato a ser conhecido sobre a psicanálise é que quase tudo que o senso comum conhece sobre o tema ou está errado, ou incompleto, fora de contexto e/ou mal interpretado. Há uma grande tendência em se literalizar o que foi descrito no campo simbólico, portanto, não é o sonho secreto de todo o homem literalmente assassinar o pai e viver maritalmente com a mãe, e 'gozo' não é um orgasmo. Mas vamos adiante.

A psicanálise foi proposta pelo conhecidíssimo S. Freud (1856-1939), médico, que se propôs a estudar o fenômeno da histeria. O senso comum chamaria 'histérica' a uma mulher escandalosa, certo? Mas a verdade é justamente a inversa. A histeria é um fenômeno que manifesta no corpo algo que não pôde ser dito. Naquela época, devido à grande repressão social que as mulheres sofriam, as conversões histéricas não eram raras, e apareciam como paralisia, cegueira e outros comprometimentos que não podiam ser clinicamente viáveis, pois mostravam-se saudáveis (e a medicina da época tomava como fingimento). Freud passou a observar essas pacientes e, a partir destas observações clínicas, experimentos com hipnose, (muitas) reflexões e estudo, desenvolveu uma teoria de desenvolvimento da personalidade que também é um método clínico e uma corrente teórica que influenciou diversos pensadores. Depois de Freud, outro grande teórico da linha foi J. Lacan (1901-1981),  que aprofundou ainda mais a psicanálise e é extremamente respeitado. Há outros nomes, como Jung e Reich, mas falarei deles em outro post, pois a teoria acabou sendo ficando bem diferente da original, para desgosto de Freud, que fora professor de ambos.

A base da psicanálise é a investigação da mente e seu funcionamento, baseado nos conceitos descritos por Freud. Em termos bem simples, cada um de nós possui três níveis de funcionamento psíquico - id (impulsos mais primitivos), ego (base não completamente consciente da personalidade) e superego (instituição da lei e da cultura), sendo que a forma em que cada criança passa pelos estágios de desenvolvimento (aqui entram os complexos, de Édipo, castração, e outros estágios que também dão margem a erros de entendimento), culmina em uma estrutura de personalidade diferente  - neurótica, psicótica ou perversa (cuidado com o subentendimento de senso comum), cada qual com seus mecanismos de defesa e particularidades.

Para situar o leitor um pouco sobre quem é o quê, pode-se dizer que boa parte da população tem a estrutura neurótica (significa que passou pelos estágios de maneira próxima ao 'esperado', por assim dizer); os psicóticos são aqueles que não estabelecem contato com a realidade; É o que o senso comum chama por vezes de loucura, mas o termo não é correto. E o perverso é aquela pessoa que não trava contato com a imposição da lei (aqui há uma longa explicação sobre a figura do pai e a imposição da lei à criança). Então, a pessoa de estrutura perversa tem ciência se faz algo errado, mas simplesmente não se importa. Seria o psicopata (o verdadeiro, pois há também pessoas que são denominadas como psicopatas, mas que não o são dentro desta perspectiva). Este é um tipo que inquieta a sociedade, e muitas vezes também é designado como 'louco'.

A ideia geral é que o que nos causa sofrimento, conhecido nesta linha como sintoma, tem suas raízes no nível inconsciente do psiquismo. São dois os níveis, consciente e inconsciente (não se usa subconsciente, segundo as orientações que recebi), e  o inconsciente pode ser acessado por meio da fala, a chamada associação livre, que gera um insight. Trazendo este ponto de conflito para o nível consciente, o sintoma poderia ser amenizado. Ou seja, se a pessoa fala sobre sua dor, ela pode descobrir a peça que faltava para encadear sua significação sobre ela e assim, livrar-se do mal estar. Não se fala em 'cura' na psicanálise. Uma pessoa não pode mudar sua estrutura de personalidade, mas pode trabalhar seus sintomas e aliviar seu sofrimento.

Dentro desse método de trabalho clínico entram os sonhos, que seriam símbolos do inconsciente e os atos-falhos (aquelas coisas que falamos sem querer), entre outros. Na psicanálise há o trabalho no divã, mas ele não é feito logo de cara, mas sim quando o paciente estiver preparado para dar vazão à fala, com o mínimo de intervenção possível do analista. 

Há um vasto rol de críticas contra a psicanálise, críticas feitas inclusive por Sophie Freud, neta de Freud, filha de Anna Freud, que era psicanalista e filha favorita. No entanto, a psicanálise segue seu curso, com profissionais se formando e pessoas optando por esse modelo de terapia. Fala-se sobre a teoria ser machista, elitista e demorada. Mas há que se considerar o contexto histórico do desenvolvimento da psicanálise, em meio à burguesia européia do início do século XX, a admitir a aplicabilidade até os dias atuais. Elitista, até daria para dizer que sim, como quase toda psicoterapia particular: envolve custos que boa parte da população brasileira não pode arcar e demanda um nível razoável de insight para ser efetiva. Pode parecer rude, mas esse modelo de terapia precisa um bom grau de raciocínio para acontecer. E sobre ser demorada, o processo costuma ser mais longo mesmo, porém não é regra. Há outras críticas que eu vejo como tolas, como acusar Freud de ter sido cocainômano ou de ser um pervertido sexual. Oras, lembremo-nos da época: cocaína era medicamento, não se conhecia os efeitos colaterais, portanto, não pode ser significada como o é hoje em dia. Inclusive, Freud utilizou cocaína para criar o primeiro anestésico oftalmológico existente. E sobre ser um pervertido sexual, acredito que na época suas declarações tenham gerado um grande choque. Porém, manter o choque até hoje é moralismo. 

Em linhas gerais: Psicanálise é um processo de investigação da psiquê, normalmente demanda tempo. Em geral, o paciente fala mais do que o analista, que comumente se limita a fazer perguntas que induzam o caminho da reflexão, e o divã é utilizado quando o paciente está pronto para tal. Há quem diga que é indicada para questões inespecíficas, como a angústia sobre a qual não se conhece a causa, mas qualquer linha teórica pode tratar qualquer problema, o que pesa mais é o quanto o paciente se identifica com o método.

Espero que tenha sido esclarecedor. Até a próxima!