Depois das explicações básicas sobre a diferença entre psicologia, psiquiatria e psicanálise, vou falar um pouquinho sobre algumas das principais linhas teóricas vigentes nos consultórios de psicoterapia. Essa explicação será bem superficial, cada uma das linhas é uma teoria diferente, formulada sobre preceitos diferentes e num contexto histórico/filosófico específico, o que exigiria um verdadeiro tratado para fazer jus à complexidade de cada uma. Além disso, há a minha limitação pessoal sobre os temas que domino e os que não. Percebi no decorrer da graduação que cada faculdade, em cada parte do país, enfatiza mais ou menos determinados assuntos, e cada aluno buscaria por conta seu aprofundamento na área que tivesse interesse. Foi o que fiz, e isso me deixa plenamente consciente de que há áreas da psicologia sobre as quais tenho pouquíssimo domínio, visto que as duas grandes áreas que escolhi são a saúde e social.
Bem, vamos então às linhas. Vou distribuí-las em algumas postagens, para não gerar textos muito longos, e hoje falarei das linhas comportamental e cognitiva, pois atualmente é difícil falar de uma sem ao menos mencionar a outra. Novamente enfatizo que não há uma linha teórica melhor do que a outra, mas sim aquela que se adapta melhor à cada pessoa, assim como o terapeuta com mais ou menos habilidade para conduzir um processo terapêutico calcado em sua demanda. Como podem ver, são muitas as variáveis em jogo, portanto é importante que as pessoas tenham uma base sobre o que podem encontrar no consultório psicológico. Então, vamos lá:
Comportamental/Behaviorismo: A psicologia comportamental ou o Behaviorismo (ou derivados desses termos, como comportamentalista e behaviorista, que são em geral sinônimos) é a linha sobre a qual eu tenho maior domínio. Foi idealizada por J. B. Watson (1878-1958), por volta de 1913, que iniciou as pesquisas da linha, utilizando principalmente o comportamento animal para desenvolver a teoria e que nos gerou um estigma lascado que carregamos até hoje devido à desconsideração de alguns fatores, tais como comportamentos encobertos e algumas declaraçõezinhas bem 'simpáticas' sobre seus experimentos e elaboração de teoria, como a clássica "Dê-me um punhado de crianças e farei delas do que quiser", entre outras questões, que, embora comuns na época, causam repulsa hoje em dia. A esta base da teoria comportamental, deu-se o nome de Behaviorismo Metodológico. Alguns anos depois, por volta de 1930, B. F. Skinner (1904-1990) elaborou uma teoria muito mais completa sobre os estudos de Watson, a qual é denominada Behaviorismo Radical. A proposta básica desta linha teórica afirma que os comportamentos (o que fazemos, pensamos, sentimos... Tudo é definido como comportamento) é aprendido, partindo de três níveis de seleção: o filogenético, ou seja, o que está inscrito no seu DNA, o ontogenético, ou a sua história de vida e o meio cultural onde o indivíduo está inserido. O processo de aprendizagem acontece de diversas formas, e neste aspecto há pontos de fusão com outras linhas, mas o carro-chefe da psicologia comportamental são os condicionamentos. De forma bem simplista, nos comportamos da maneira que fazemos porque o aprendemos assim. E, da mesma forma, podemos aprender de outra maneira, caso tenhamos aprendido de forma disfuncional. Por exemplo: um indivíduo tem medo de cães. Isso acontece porque, em determinado momento, ele aprendeu que cães lhe ofereciam perigo, e isso se generalizou, sendo que qualquer cão, por menor ou mais inofensivo que seja, desperta um medo extremamente intenso nesse indivíduo. É um caso de fobia específica. Em terapia há técnicas específicas para que esse comportamento- o medo - diminua e até mesmo acabe. Na terapia comportamental não há divã, o paciente/cliente (de novo, discussão enjoada sobre termos a serem utilizados. Eu utilizo paciente, mas há quem prefira cliente. Objetivamente falando, dá na mesma - e já posso ouvir psicólogos me xingando por esta declaração) senta-se de frente para o terapeuta e ambos dialogam de maneira equilibrada; o paciente fala sobre si, o terapeuta operacionaliza o relato, e propõe a intervenção. As críticas sobre esta linha recaem sobre a suposta frieza do terapeuta, o que sinceramente não se sustenta na abordagem, mas sim no estilo pessoal do terapeuta e no estilo diretivo e superficial, que é uma leitura que pode ser feita observando o exemplo que eu dei: há uma queixa, soluciona-se a queixa por meio de instruções, e o paciente vai embora. Porém, esta crítica não se sustenta no momento em que se há compreensão sobre como o processo terapêutico ocorre: o terapeuta comportamental faz um levantamento sobre o histórico vital do paciente e vê o comportamento disfuncional dentro do contexto, e possivelmente encontrará outros pontos. O foco da terapia é conduzir o paciente ao autoconhecimento, a partir do qual ele terá como lidar com suas demandas sozinho, aprendendo a ler suas próprias questões e resolvê-las.
Já a psicologia cognitiva, ciência mais recente, estuda os processos mentais (cognições) por trás do comportamento, tais como memória, pensamento, atenção, raciocínio entre outros. São utilizadas várias metáforas para a explicação destes processos, tais como o funcionamento do cérebro de forma semelhante a de um computador. A diferença primordial é que o cognitivismo entende o pensamento como cognição, e a psicologia comportamental como comportamento. Disso se desdobram muitas implicações e esquemas epistemológicos nos quais as duas linhas discordam entre si, sendo que a base da terapia cognitiva a modificação do pensamento para gerar a mudança do comportamento (e a proposta do behaviorismo, a modificação do comportamento para torná-lo funcional, incluindo o pensamento, que também é comportamento) porém, de maneira geral, as técnicas de cada uma são compatíveis com as da outra, gerando uma interação bastante utilizada e bastante efetiva.
Se o terapeuta se declara cognitivo-comportamental, isso pode significar três coisas: que ele é um psicólogo comportamental que utiliza técnicas cognitivas (meu caso), que é um psicólogo cognitivo que utiliza técnicas comportamentais, ou ainda é alguém que não conhece bem nem uma coisa nem outra, faz uma mistureba tremenda e aplica terapia modelo 'receita de bolo' e cobra caro por isso. Para um leigo, é difícil ver diferença entre eles. Falando sobre os dois primeiros, que são o que se espera que um psicólogo seja, o trabalho de ambos será bem semelhante, o que difere é a base epistemológica por trás da proposta. Caso a pessoa tenha interesse, pergunte ao terapeuta, ele poderá explicar no que seu trabalho é baseado.
Em poucas palavras: a psicologia comportamental e a cognitivo-comportamental se utilizam de interação entre o terapeuta e paciente, costumam ser diretivas após a operacionalização da queixa, e, por isso, objetiva e com duração relativamente breve (quando viável ao caso). Atualmente são as linhas mais indicadas para intervenção psicológica pela psiquiatria.
Até a próxima!